27 março 2010

Associação Empresarial da Região do Algarve: Turismo – Nova fase. Nova visão

Vítor Neto – Empresário e Gestor, presidente do NERA, Associação Empresarial da Região do Algarve, assina esta coluna uma vez por mês

O Turismo é de facto um mundo muito especial. Ou melhor, uma verdadeira «constelação», como diz o Prof. Ernâni Lopes.

Nas fases heróicas de crescimento, o Turismo brilha em todo o seu esplendor de sucessos, projectos, investimentos grandiosos e até heróis. As certezas absolutas sobre os «produtos» que no futuro serão procurados por milhões de turistas são inabaláveis. Foi o que se passou nas últimas décadas, do «Club Mediterranée» ao «Dubai».

Em Portugal a última década tem sido fértil nas ambições e nas desilusões. Basta recordar o objectivo de colocar Portugal, em dez anos, no «top ten» do turismo mundial (D.Barroso, Maio 2003) e as metas do Pent (2006) para 2009 (15 milhões de turistas) ou 2015 (20 milhões).

Nas fases de quebra tudo se esquece e misteriosamente deixa-se de falar em números. A «crise» explica tudo. Mas ficam os factos.



E se olharmos para os factos, verificamos precisamente que o crescimento do turismo nunca foi linear, em nenhum país ou continente e também em Portugal. Em todos eles tem-se assistido sempre a períodos de crescimento, rápido ou lento, e de estagnação, curta ou longa. Com diferentes fases, objectivos, tendências. E olhares, opiniões, estratégias, diferentes.

Onde está Portugal, hoje?

Vejamos, por exemplo, o número de turistas estrangeiros entrados no país: passou de 2,7 milhões em 1980 para 12 milhões em 2000. Mais do que quadruplicou em vinte anos. E onde estamos em 2009?

O processo de crescimento, muito rápido nos anos 80, não foi nada linear e muito menos regular até hoje. Da consagração do Algarve e a entronização do «hotel» como centro do turismo, à descoberta da mina aparentemente inesgotável dos apartamentos, aldeamentos e do «timeshare», até ao golfe, aos resorts e ao «turismo residencial», vimos e ouvimos de tudo. O «sol e mar» e o Algarve passaram do endeusamento à descrença.

Trinta anos passaram desde 1980 e os números estão aí, a obrigar-nos a reflectir.

O número de turistas estrangeiros entrados em Portugal passou de 2,7 milhões em 1980 para 8 milhões em 1990 (mais 5,3 milhões, em dez anos). Temos aqui o peso do Algarve.

Sete anos depois, em 1997, os turistas estrangeiros entrados em Portugal subiram para 10 milhões (mais 2 milhões, em 7 anos). Mas em 2000 já ultrapassaram os 12 milhões (mais 2 milhões, em apenas três anos – Expo98 e pós Expo). Temos aqui, para além do Algarve, o importante peso de Lisboa.

Nos anos seguintes o número de turistas estrangeiros entrados primeiro caiu (2002,03,04), depois estagnou, apesar de um breve pico em 2006/07 e, em 2009, terá caído, provavelmente (deixou de haver números oficiais…), para perto dos 11 milhões, isto é para os números de 1998/99 (ITP,2005). Os dados oficiais (INE/TP) sobre as dormidas e as receitas (a preços constantes) dos estrangeiros, confirmam estas tendências.

É nesta fase, de estagnação prolongada, que estamos desde 2000-2001.

Mas há quem não queira perceber o que se passa. Por isso também têm dificuldade em perceber o que se passou em 2008-2009 e em apontar um rumo para o futuro que vá para além de «medidas» para responder a uma conjuntura gerada apenas por uma «crise» que atingiu «todos» e que …acabará por passar!

Claro que «passa», mas o problema é saber qual o estado em que nos encontraremos para cavalgar essa retoma, em relação às tendências da procura, à acção da concorrência, à actuação sinuosa e incerta dos mediadores de mercado (operadores, low costs, Internet…) e ao aparecimento de novas propostas de produtos e mercados.

Acho errado que se subestime e despreze a Turquia quando já há empresários portugueses a investir lá! Não percebo como é que se tenta escamotear que a Turquia voltou a crescer em 2009 (+3%) e recebeu mais ingleses (+260.000;+11,8%), só porque isso contraria a tese de que «todos» caíram. Assim como não entendo que se subestime a importância do esforço para reconquistar as posições perdidas nos mercados «tradicionais» como o mercado inglês, afirmando-se, como já ouvi, que não temos perdido posições nesse mercado, quando os dados oficiais estão aí, à frente dos olhos de todos.

Há aqui qualquer coisa que está mal.

Começamos a assistir a um fenómeno que é recorrente nos momentos de crise, que é a dificuldade em perceber as causas dos problemas que as empresas enfrentam, as suas preocupações com a continuação das quebras, a ausência de luz ao fundo do túnel, e o atraso na retoma. E o que é mais preocupante é a diversidade de opiniões e de propostas de sector para sector, de região para região. A hotelaria tradicional, pressionada pelos preços, hesita perante o «tudo incluído», apesar de alguns grupos já o praticarem. O golfe não esconde as suas preocupações perante as persistentes quebras. O sector da imobiliária turística, mal acordado de um sonho que se está transformando em pesadelo, não esconde a sua dor. Surgem opiniões divergentes sobre as razões e o papel dos grandes operadores que se afastam de Portugal e sobre a atitude a ter com eles. Depositam-se esperanças milagrosas nas companhias low cost, ainda que associadas a preocupações. Discute-se o papel/eficácia da nossa promoção, enquanto a West Coast, que parecia enterrada, se mantém como conceito/imagem. Ao mesmo tempo mistifica-se o mercado interno (importantíssimo), como se ele compensasse as perdas do mercado externo… enquanto se «descobre» a Espanha… e se subestima o Reino Unido…

Estas opiniões reflectem, no fundo, «olhares diferentes» de uma nova fase, no quadro de uma estagnação persistente.

Trata-se de uma realidade em movimento, expressão de incertezas, mau estar e impotência perante um quadro confuso, que necessitaria de uma resposta adequada que só pode ser uma visão estratégica clara, capaz de apontar um rumo, introduzir segurança e certezas, nesta caminhada hesitante do turismo português. É urgente.

Fonte: Publituris

Sem comentários:

Gambuzinos - O Melhor de Portugal está aqui!